Francisco Perna Filho
Os rios, naturalmente, correm. É da natureza deles o livre curso. Não tem nada que os impeça, rompem qualquer obstáculo que se lhes apresente. Não fazem distinção de tempo e leito, não consideram castas nem poder, retumbam os gritos ancestrais; não param nunca, mesmo quando lhes desviam o curso, mesmo quando desembocam no mar.
Pelos rios, os homens descobriram outras terras, alimentaram descobertas e distâncias. Neles, depositaram esperanças, viram-se refletidos e morreram inúmeras vezes, como o meu avô, Manoel de Sales Perna, um exímio nadador, a quem o rio não deu guarida, engolido pelo Tocantins ao salvar a minha prima, Maria Úrsula, bem próximo à cidade de Carolina, no Maranhão.
As pessoas morrem, os rios são perenes. A qualquer tempo, estão
Dele sei pouco, mas sempre pude imaginá-lo, quando não pelas histórias contadas pelo meu pai, Francisco Nolêto Perna, pela fotografia ampliada que o meu tio, Tito Perna, traz emoldurada na sala de sua casa e, mais recente, sendo redescoberto, por obra da ficção, pelo escritor Bernardo Carvalho, no premiado “Nove Noites”, Companhia das Letras (2003), quando o engenheiro Manoel Perna, que na vida real era barbeiro, pôde contar a história do antropólogo americano Buell Quain, discípulo de Ruth Benedict da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, que se suicidou em 1939, aos 27 anos, poucos dias após deixar a aldeia Krahô, a caminho de Carolina, no Maranhão, para se encontrar com o meu Avô. Fato que, embora sirva à ficção de Carvalho, aconteceu na vida real, como atestam os documentos e o testemunho do meu pai.
Apesar de não ter podido conhecê-lo em vida, vejo-o sempre em meu pai, em mim, nos meus filhos e irmãos. Vejo-o no rio que o engoliu, pois passou a fazer parte dele, uma vez que o seu corpo nunca foi encontrado. Eternizou-se nas suas corredeiras, imortalizou-se no seu remanso, como na mitologia: os rios da eternidade.
Vejo-o sempre quando vou a Miracema do Tocantins, quando miro o rio do Porto do Padre, da Praia de Areia, do Flutuante do “Seu” Manoel, da Praia do Urubu, da Usina do Lajeado. Muitos desses lugares, que agora citei, já não existem mais, mas vivem na minha memória, como o meu avô, que, pela obra da ficção, virou personagem e “zombou” do rio que o engoliu.
Amigo Perna, o rio tem dessas coisas, gosta de engolir os que ele ama. Aninha-os ao seio para a eternidade.
ResponderExcluirEsse tópico tratyo num conto ambientado no Tocantins, no nosso Tocantins, em Carolina:
http://www.overmundo.com.br/banco/denizart-e-o-rio-conto
Desculpe pelo "tratyo" no comentário anterior, que na realidade é trato.
ResponderExcluirabraços
jjLeandro
Meu querido Perna, linda esta históri do rio que engoliu seu avô! Um bom título para um livro de contos e causos. Desenvolva isso. É por isso que lembro do meu POEMAS DA MARGEM ESQUERDA DO RIO DE DENTRO e o vejo imerso nele.
ResponderExcluirGilson Cavalcante