Por Francisco Perna Filho
Originalmente, esta entrevista foi veiculada no jornal Hoje, de Goiânia, no ano de 2006, na página de cultura que eu editava: Mosaico. Para uma melhor percepção do leitor, atualizei a idade do autor.
Considerado um virtuose da composição, Estércio Marquez Cunha ainda é pouco conhecido pelos goianos
As raízes da composição
A sala de estar é ampla e sóbria, paredes decoradas com desenhos e algumas telas. Contígua a ela, do lado esquerdo, uma outra abriga o piano, cd's e livros. Do lado direito, uma sacada espaçosa, com plantas e móveis rústicos, dentre eles, uma mesa, contendo papéis, anotações, e algumas partituras, o que leva a crer que ali seja um dos lugares prediletos do compositor, que recebeu a reportagem para um agradável bate-papo.
Estércio Marquez Cunha, 68 anos, é goiano de Goiatuba, professor universitário e compositor, referência no meio musical, principalmente pela importância das peças que compôs para piano e violão. São peças para violão solo, música para violão e violino, flauta e violão, música para soprano, e música para dois violões. Para piano solo, são sessenta e quatro peças, sem falar nas que compôs para instrumento solo, câmara, coro, orquestra e música-teatro.
Durante muitos anos, viveu no Rio de Janeiro, onde se formou em Piano, Composição e Regência no Conservatório Brasileiro de Música. Mesmo antes de se formar, já era professor de música na rede pública do Estado da Guanabara. Foi professor de análise e harmonia musical na Universidade Federal de Goiás, cadeira que inaugurou, por concurso público. Fez o mestrado em Música e o doutorado em Artes Musicais (composição) pela University of Oklahoma (USA), em 1982. Hoje ensina nos cursos de pós-graduação.
O compositor,mostrando-se muito à vontade, falou da vida, da educação no Brasil, que, para ele, está falida: "A escola não prepara o indivíduo para pensar e refletir; o que há, de fato, é uma preocupação em formar mão de obra". Com relação às artes, Estércio foi bastante enfático, criticando o momento atual, naquilo que ele considera como imediatista, sem nenhum aprofundamento, pessoas que se dizem “artistas”, mas apenas repetem, nada criam, o que não leva a lugar algum: "Não dá para enganar, essas pessoas pecam pela falta de criatividade, pelo imediatismo e repetição". Para ele, isso não se dá apenas na música, mas em todas as áreas, incluindo a literatura: "Colocar uma roupagem no que já existe não contribui para nada, é preciso ir além. Vejam o que tentaram fazer com a música de raiz... não deu certo, virou isso aí"(uma referência à música feita pelos "sertanejos").
Quando perguntado sobre o panorama musical brasileiro, ele assim se pronunciou:
“A Escola de Música da UFG tem formado muita gente boa, o que coloca Goiás como destaque no cenário musical brasileiro, basta vermos os nomes que têm despontado, podendo citar: a pianista Lúcia Silva Barrenechea; o violinista Eduardo Meirinhos; Ângela Barra e Marcília Álvares no canto, e, na composição, Paulo Guicheney e Rodrigo Lima”.
Influências musicais
Estércio, ao falar da sua formação, se entusiasmou com a pergunta sobre as suas influências musicais: "Eu ficava encantado com aquelas melodias (modas de viola), mas tinha de ouvi-las escondido, pois a minha família dizia que moda de viola não era música séria. Naquela mesma época (infância), além das modas de viola, eu me encantava com a criatividade de Luiz Gonzaga (o Gonzagão). Eu ficava maravilhado ao ouvi-lo pelo rádio. Até hoje eu o cultuo. Mas, um dia, eu ouvi um outro tipo de música, fiquei extasiado com a melodia, não sabia o que era aquilo, ou quem a executava, fui atrás, só depois descobri que se tratava de Stravinski, Igor Stravinski (compositor russo, um dos mais influentes nomes da música do século XX - 1882 - 1971). Uma grande descoberta, monumental! foram essas as primeiras influências".
Estércio, de algum tempo para cá, tem produzido mais para violão, instrumento para o qual dedica um carinho especial e que tem repercutido muito no Brasil e no exterior. Aguarda, para breve, a gravação de uma peça: "trio para violão", pelo grupo goiano El legno. No momento, a sua obra está sendo estudada na Espanha e executada em várias partes do mundo.
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