TELA DE PASSAGEM
Um veio, um olho,
entre moitas e muitas
pedras o Rio Vermelho
injeta suas artérias,
lustra fitas de clorofila
do mato esmaecido
cresce, amontoado,
cochichando. O rio
velho nos casarios
nem descabelava pedras.
Nos vasilhames
de velharias e eras,
às famílias fantasmas,
em paredes-mesas postas,
servia licores de líquenes.
Um dia choveu na noite
quebradiça, secular.
O grande porte do espaço
se partiu. O ar acidentado
dos morros, as dobradiças
de pedra... nenhum obstáculo:
represas irregulares
em disparada – reses de lama –
invadiram a cidade.
Paredes como ramas
tombaram. Muros artríticos
com juntas de rocha
ruíram. A eles trouxas
de sombras, seixos
rio sem eixo rolaram.
Partidos, vasos de rosas
e poças. Jarros jorraram
pétalas de barro
pelos bueiros. A hemorragia
de ruídos do rio
trincou o piso das ruas.
Agora quintais paralisados.
A cidade pende de um lado,
do outro, tombada.
Restou uma gota de lama
no rosto de bronze
da estátua revelada.
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