Maria Elizabeth Fleury - Crônica

Goiandira do Couto
 Foto by Weimer Carvalho- O Popular


Terra linda e venturosa, terra amada de meus pais




 Somente corações generosos de coroadas cabeças da atual diretoria do SESI goiano,  teriam a sensibilidade de ceder uma condução com motorista, proporcionando, a pequeno grupo de intelectuais goianos a oportunidade de conduzir o casal de escritores e historiadores de Porto Alegre (RS), Moacir e Hilda Agnes Hübner Flores, para conhecer a outrora Vila Boa, antiga Capital de Goiás, hoje, orgulhosamente, Patrimônio Cultural da Humanidade. E, sob cálido sol matinal deste mês de agosto seguiram todos, quais adolescentes em recreio, rindo, conversando, cantando e recordando saudosas cantigas como a “Balada goiana” de Manoel de Amorim: Todos têm um amor na vida/que os inspiram a cantar/ eu só tenho a minha cidade/ minha terra, meu sonho, meu lar... Lá chegando, aos poucos, a cidade foi desvendada, mas dois desejos seriam primeiramente realizados: visita à casa de Cora e à arte em areia nos belos quadros de  Goiandira, fundadoras da Academia Feminina de Letras e Artes de Goiás-AFLAG.
       
Para melhor apresentação da cidade, buscamos os versos de Rosarita Fleury, uma de suas amorosas filhas que, ainda, menina-moça a deixou, sem nunca esquecê-la. Saudosa, registra em poemas e romances sua história, sua beleza, usos e costumes de sua gente simples, hospitaleira, inteligente e honrada... Aos pés de verdes morros a cidade se estende cintilante/ nos dizer do poeta é pérola engastada no verde-jade de concha fascinante... Ponte da Lapa, do Carmo, Cambaúba altaneira, rio Vermelho, as pedras, as lavadeiras... Cruz do Anhanguera, de tão distante era! / o Palácio Conde dos Arcos, o bom Colégio Sant’ana/a Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte/ a Catedral por fazer, tão sem sorte... / o sino do Rosário badalando, convidando... convidando.../ /Igreja D’Abadia, de Nossa Senhora do Carmo e São Francisco/ Rua Nova, tão velhinha, Rua Direita, tortuosa, de todas a mais tortinha!...No entanto a saudade grande é da Rua Rosa Gomes/ onde por anos morei e onde há, nos quintais/ tanta fruteira bonita plantada por meus pais... (do poema Goiás Recordação).


Entrando na casa de Cora Coralina, fomos recepcionados por seu retrato em tamanho natural e lá nos mergulhamos nos séculos XIX e XX, vendo-a em gravações e ouvindo-a declamar seus poemas de mulher sofrida, altaneira, guerreira. E, enquanto conhecíamos todos os ambientes, suas seculares paredes nos espreitavam, nos questionavam, fazendo-nos reféns de sua poética... Goiás minha cidade/eu sou aquela amorosa/de tuas ruas estreitas, curtas, indecisas/saindo uma das outras./Sou aquela menina feia da ponte da Lapa/sou Aninha/ Sou Cora Coralina/Venho do século passado e trago comigo todas as idades./Despojada,apedrejada/sozinha e perdida nos caminhos incertos da vida fui caminhando,caminhando.../Fiz um nome bonito de doceira, glória maior/E nas pedras rudes de meu berço gravei poemas...(versos de vários poemas) Depois de um almoço tipicamente goiano no Restaurante Ipê, com direito à sobremesa, levaríamos nossos visitantes a conhecer a beleza ímpar dos quadros pintados com areias coloridas da Serra Dourada, arte/criação de nossa internacional Goiandira do Couto.


Veio a decepção: O casarão, que foi de seus pais, hoje a Casa de Goiandira, um verdadeiro palácio da cultura, estava fechado. É lá que ela guarda inúmeros de seus quadros, assim também o atelier construído por ela para abrigar suas obras e receber os turistas. Numa sala em sua casa, onde trabalhava, há para visitação dos turistas 515 potinhos de areia com as cores matizadas da Serra Dourada - o precioso material de sua pintura. Tudo isso, orgulho e riqueza goiana, sempre mantida por ela, mesmo doente e hospitalizada em Goiânia.  Quantas vezes ela abriu mão de seu descanso, atendendo turistas ou amigos mesmo em crise de labirintite?  Informada por familiares, soubemos que somente meados do mês passado (julho) é que o funcionário foi dispensado, estando agora tudo fechado. Que pena!... Nossa visita fica para outra oportunidade. Sabemos que seu estado de saúde é delicado e ela,  com seus noventa e tantos anos de dedicação completa à sua arte, muito já fez, levando o nome de Goiás por todo Brasil e internacionalmente.


Depois de um cafezinho amigo na Chácara Baumann, visitamos o Palácio Conde dos Arcos, o Museu de Arte Sacra e tantos outros pontos turísticos, locais de que muito nos orgulhamos pelo zelo, limpeza,  organização e competência dos funcionários. Despedimos da cidade saboreando os tradicionais sorvetes e picolés de frutas tropicais da Praça do Coreto e o desejo de um breve regresso. Hoje (22,ago), enquanto relia esta crônica para encaminhá-la ao DM, recebo a notícia que Goiandira não mais vive entre nós. Sua alma cansada subiu ao Céu, deixando-nos a riqueza de sua arte única e maravilhosa. Descanse em paz, querida confreira e amiga.
                                                      
Maria Elizabeth Fleury – membro da AFLAG, UBE, ATLECA e ABLAC.


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