Francisco Perna Filho - Conto
Guillaume Apollinaire - Poema
Guillaume Apollinaire
Guillaume Apollinaire - grafismo de m. almeida e sousa
Nasceu em Roma, em 1880, filho de uma nobre polaca e de pai desconhecido (possivelmente um oficial italiano com quem a mãe vivia na época do seu nascimento). A infância e adolescência de Guillaume e do seu irmão, Albert, repartiram-se por várias cidades, obedecendo à errância amorosa da mãe: Roma, Paris, Mónaco, Cannes e Nice.Aos 20 anos, instalado em Paris, interessou-se por literatura e política, revelando simpatias anarquistas. Começou a procurar emprego. Também nessa altura, inicia a escrita novelas eróticas para sobreviver. Nos anos seguintes, viajou até à Áustria, Alemanha e Inglaterra. Por volta de 1901, quando trabalhava como perceptor de uma família alemã, conheceu e apaixonou-se por Annie Playden, a governanta inglesa. Este amor não correspondido inspirou-o a escrever «A canção do mal amado».
Entre 1902 e 1907 publicou contos e poemas em várias revistas (incluindo a portuguesa O Portugal Futurista). Entre os seus amigos de Paris dessa altura, contam-se Picasso, Rousseau e Delaunay, entre outros.Em 1911, foi preso por suspeita de roubo de umas estatuetas fenícias do Louvre. Em 1913, publicou Alcools, uma recolha do seu trabalho poético desde 1898.Alistou-se no exército francês em 1914, e partiu para a guerra (uma ocasião que lhe serviu para se declarar «francês genuíno» e servir a sua pátria). Combateu na Cavalaria, e mais tarde passou à Infantaria. Para não perder a veia poética, trocava abundante correspondência com os amigos e a mais recente paixão não correspondida, Louise de Coligny-Châtillon (ou «Lou», como lhe chamava nos poemas). Acabou por ser ferido na cabeça pela explosão de um obus.
Depois de recuperar, e já em Paris, voltou ao trabalho: levou à cena a peça Les Mamelles de Tirésias e publicou Calligrammes. Em 1918, casou com Jacqueline Kolb (a «linda ruiva» do último poema de Calligrammes), mas enfraquecido pela ferida de combate, morreu em Novembro desse ano, de gripe espanhola. Tinha 38 anos. Foi enterrado no cemitério de Père Lachaise, enquanto pelas ruas de Paris se festejava o fim da guerra. (Fonte: Assírio & Alvim)
TIVE A CORAGEM DE OLHAR
Tive a coragem de olhar para trás
Os cadáveres dos meus dias
Assinalam o meu caminho e eu choro-os
Uns apodrecendo nas igrejas italianas
Ou entre os limoeiros
Que dão ao mesmo tempo e em qualquer estação
A flor e o fruto
Outros dias choraram antes de morrerem nas tabernas
Fustigados por ardentes ramos
Sob o olhar duma mulata que inventava a poesia
E as rosas da electricidade abrem-se ainda
Nos jardins da minha memória.
In. O Século das Nuvens, trad. Jorge Sousa Braga, Assírio & Alvim, 2007
Francisco Perna Filho - ensaio curto
AETERNUM
Por Francisco Perna Filho
Ruidosos de tempo e prisioneiros das próprias sentenças, ao dispararem os seus ponteiros irrefletidamente e se repetirem em realidades tão diversas, os relógios nos dizem muito do embaraço da nossa existência.
O tempo explica tudo, a despeito de qualquer pacto ou sentimento; de qualquer nobreza ou oligarquia. Às vezes é preciso aquietar-se para ouvir os seus murmúrios, os seus sinais, embora muitos não se mostrem sensíveis a isso ou, de outro modo, não durem o suficiente para testemunhá-lo.
O agora está estampado - neste exato momento - tão óbvio quanto esta afirmação, e é por ele que comprovamos o que antes se nos apresentava como improvável, absurdo, irrealizável. Tudo às claras, medonhamente plausível: a materialização da nossa insuportável espera, da constatação da nossa perecibilidade.
Talvez com os anos tenhamos a certeza de que o futuro é uma invenção, não chegaremos nunca a ele. O presente é o que somos, modelados à forma do nosso passado, das nossas recordações. Tão somente existimos, e existimos porque lembramos, porque somos capazes de nos convencer da unicidade do tempo, da fluência de suas teias a enredar a nossa ilusão, a magia da nossa permanência.
Nada passa incólume ao tempo, nada dele se esconde, muito embora tantos tentem provar o contrário: que os digam os potes de Renew, Cronos, Neutrogena, substâncias retardadoras do envelhecimento, abrandadoras das rachaduras da pele, restauradoras das nossas ilusões. Nada disso cicatriza as erosões da alma.
O que sabemos da vida, a não ser que a possuímos até perdê-la. Melhor dizendo, como encaramos o nosso dia-a-dia e refletimos o nosso modo de existir? Não estaríamos distantes demais daquilo que seria considerado ideal para um ser humano?
Se a morte é a única certeza que nós temos com relação ao futuro, o que nos parece óbvio, a ausência que ela provoca pode ser relativa, ou melhor, o que se supõe como fim, pode ser apenas o começo de uma perpetuação.
O ápice do amor é a morte, diz George Bataille, no seu livro O Erotismo, já que, para que se tenha vida, é preciso que outros seres morram, e isso só se dá no paroxismo do amor, aqui entendido como a força de Eros: vida, em oposição a Thanatos, morte.
Tudo o que temos ou fazemos agora, sem sombra de dúvida, amanhã será lembrança, e seremos lembrados na mesma proporção das nossas ações, dos nossos acordos, dos nossos desatinos. O que diferencia uma manhã de sol de uma manhã de chuva é apenas a forma como elas se mostram, as manhãs continuarão sempre manhãs, até que anoiteça, e elas serão apenas lembranças, como o são: O 11 de setembro, O massacre no Iraque, O acidente de Chernobyl, a desencapsulação do Césio 137. Numa linguagem mais moderna, o passado nos forMATA.
Visgo Ilusório
LITERATURA Lembranças de uma infância em versos Obra Visgo ilusório será lançada hoje pelo escritor Francisco Perna Filho Shara Rezende Uma das coisas mais difíceis na vida é encontrar a palavra certa para aquilo que queremos expressar. “Pois bem, escritores, poetas, compositores, todos eles de alguma forma já trataram desse assunto, falaram da luta diária pelo verbo preciso, pelo vocábulo não corrompido, pela palavra ideal para traduzir um estado de espírito, um sentimento vivido, ou para, simplesmente, relatar as impressões do cotidiano.” É partindo dessa ideia que o escritor Francisco Perna Filho escreveu o livro Visgo ilusório a ser lançado nesta quinta-feira, às 20 horas, na Cantina Boa Massa, em Palmas. A obra faz parte da coletânea Goiânia em Prosa e Verso, uma parceria entre a Prefeitura da Capital goiana, editora Kelps e a Universidade Católica de Goiás. “Se trata de um livro de poesia, onde conta lembranças da minha infância, daí veio o nome visgo, que era uma pasta colante feita com substâncias extraídas de uma jaqueira utilizada para aprisionar pássaros. Partindo disso, eu fiz essa analogia para o texto e poesia, porque a palavra é uma convenção humana, nós nos convencionamos a chamar as coisas por um determinado nome sendo que aquilo é arbitrário, tentamos nos aproximar ao máximo, mas às vezes aquela palavra ainda não consegue expressar o que queremos”, diz o escirtor ao explicar o motivo do nome do livro. “Porque a palavra está presa ao seu significante e significado, na verdade, é apenas um ilusão e o poeta luta contra isso.” O livro é dividido em cinco partes que retrata as poesias da infância do escritor. “Eu começo com O olhar, em que eu trago poesias da minha infância, do meu pai e uma autobiografia. Depois vem o Voo onde eu falo da poesia e do ofício do poeta, tem o Mergulho que é mais voltado aos sentimentos, e depois tem o Revoo onde eu reflito sobre o homem que está preso sob as mazelas da humanidade. Por último tem o visgo que trata da modernidade, do trânsito, do caos diário”, finaliza. Coletânea A coletânea é composta por 100 obras de diferentes autores que falam da capital goiana em verso ou prosa. Cada livro terá mil exemplares, sendo que 700 serão distribuídos em escolas, bibliotecas e universidades de Goiás. Os números restantes serão entregues aos autores, como forma de pagamento autoral, e poderão ser vendidos. A ideia da coletânea é reunir o trabalho de um escritor com o de um artista plástico. Visgo ilusório está acompanhado da pintura Rio vermelho, do pintor goiano Amaury Menezes. Perna Filho já faz um trabalho semelhante em seu blog pessoal Banzeiro - a poesia em movimento, que pode ser acessado pelo link http://banzeirotextual.
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Prêmio Literário
LiteraCidade
poemas, contos e crônicas – tema livre / 2010/1 - tema livre
Os professores Abilio Pacheco e Deurilene Sousa – organizadores da Antologia Literária Cidade – promovem este prêmio literário nacional com o intuito de incentivar novos talentos literários, valorizar produtores literários já existentes e trazer a lume para o público da Região Norte estes nomes, de modo a valorizar, incentivar e promover a leitura.
Mais informações, clique aqui
Damário Dacruz - Poema
Moema de Castro e Silva Olival - Ensaio Crítico
A REFEIÇÃO DO POETA
Em busca do maná existencial
Com prefácio do escritor Goiamérico Felício Carneiro dos Santos e orelha de Luiz Serenini Prado, o poeta e professor Francisco Perna Filho lançou seu livro de poemas Refeição, editado pela Editora Kelps, em 2001, com ilustrações infantis (de autoria de seu próprio filho de cinco anos, João Pedro Tavares Perna) e que, na intenção ao autor, não estão ali aleatoriamente, mas como coadjuvante de sua proposta temática. Vejamos. O projeto poético em questão gira em torno do eixo contrapontístico: realidade física circundante e o efeito destrutivo desta realidade sobre o “eu interior”, em busca do equilíbrio do ser humano, na sua bipolaridade: corpo e espírito. Recorre ao potencial energético da alma, induz à prática da visão lúcida, aguda, que mostra ao homem o tempo que lhe coube, as contas do rosário de sua travessia, os indícios dessa presença reconfortante e, muitas vezes, obscurecida, para o possível encontro do “alimento” que refaz, que se propõe reconstituir a unidade ameaçada.
E frente à perturbadora desordem de um “Cafarnaum” que o avassala, “nada há de novo que não nos mostre o velho”, e que, por isso, lhe instala a angústia, que o oprime e o deprime; resta ao ser humano “espectar”. Reconstituir-se, no tempo, operando memória, único recurso de solda dos fatos circunstanciais, para poder ocupar seu verdadeiro espaço de agente de seu destino. É preciso que não se perca de vista o propósito de recuperação, que o homem se permita sonhar, “voar”, para que encontre, no horizonte, as perspectivas de reabastecer-se e reenergizar-se, para poder enfrentar, lutar. Então, o poeta insiste na fome da liberdade, no contraponto de idéias que dividem o nosso “ego”, que balançam a nossa psique.
O livro se constitui de três partes. Com a primeira, iluminada por epígrafe de Fernando Pessoa, se instala o espaço das dúvidas, a dureza do enfrentamento da realidade. E o significativo poema “Montanha” nos faz descortinar o pétreo espaço:
A palavra pesada persegue a pedra, revela o austero pulsar do silêncio e, com ele, inaugura um olhar de montanha.(Refeição, p.19)
Metalingüisticamente, o poeta aponta, também, para a árdua luta na escolha (“no olhar”), na pesquisa da palavra-cerne, da palavra essencial. A significativa metáfora “olhar da montanha” aponta para a dureza dessa busca, que o preocupa e o instiga, arregimentando experiência, para firmar-se neste terreno tão árduo para os poetas e em que já se revela promissor.
Na segunda parte, instala-se o primeiro round dessa luta, quando o poeta, com plena demonstração da referida palavra aguda e perseguida, dá vazão ao seu “olhar de montanha”. Vejamos no poema “Todos” (com epígrafe de Manoel de Barros), como ele se expressa no claro propósito de agasalhar, em si, a síntese da humanidade:
Tente a revisão do ultrapassado, a coesão da arte do absurdo, a adaptação ao pós-moderno (...) Em mim estão todos. Eu sou todos. (Refeição, p.33)
“O rio continua no riso pálido do pescador extático no hiato das culturas, na incontinência dos jovens poetas” (Refeição, p.37)
Sente-se o alento primacial que batiza o universo e, em reforço a essa imagem, é que Francisco Perna parece acrescentar a linha primeva da pintura do menino de cinco anos. Também, a partir desse olhar, é que se justifica, a nosso ver, o pragmático título Refeição, e não um outro, trabalhado pela transfiguração e, por isso, mais carregado de poeticidade, como “Realento”, ou “Renascimento”, ou qualquer outro nesta referida linha. Tem a força crua da realidade, fazendo transparecer o outro pólo de nossa unidade, o espiritual, uma vez que esse alento deve representar o êmulo da necessária reação. Destruí-lo é perdê-la, como tragicamente se constata no poema “Essencial”.
O enfrentamento da realidade deve resultar, pelo potencial de reflexão, na lucidez que permite descortinar o campo de batalha, que permite visualizar o que resta ao ser humano. Reagir, sim, pois cabe ao homem “parir o vôo de destinação”, já que a vida é múltipla e toda “estrada traz o peso dos passos”.
Nota-se, no exemplo a seguir, como o poeta acha a palavra delineadora, caricatural, criando a imagem expressionista, prenhe de carga social:
Assim a leveza do estômago que passivamente soletrava o pão. (Refeição, p.65)
Há, sem dúvida, um sopro revolucionário a sugerir e a comandar a reação necessária.
E aquele pensamento básico — “parir um vôo de destinação” — segue comandando a temática do livro, que discute a consciência da sensação de impotência do ser humano, deslocado de si mesmo, como se comprova em “Palavras de um Morto”:
Há um grito em cada verso meu, grito abafado, mas sereno. Um grito continental de clamor e piedade pela humanidade.
O clímax desse estado de espírito é alcançado pelo sujeito lírico, quando, assumindo, explicitamente, os cinco anos do filho do poeta, idade da esperança, mostra-se, em contrapartida, “totalmente desesperançado numa paisagem de desamor, de guerras, de extermínios, como vemos em “Kosovo”:
Estou com cinco anos, a lua acaba de se apagar. (Refeição, p.94)
Na terceira e última parte do livro, agora iluminada por epígrafe de García Lorca, “Ydespués”, canaliza-se a angústia pela constatação da impotência frente ao tempo que circunscreve os problemas que atingem os homens, “peregrinos das insolúveis sentenças”, bem como se evidenciam os meios de reação.
A metaforização das imagens que suscitam o desfilar das carências vitais do homem, carências indiciadas pelas metáforas que traduzem os elementos primaciais da vida (como os alimentos, por exemplo, daí o título, não só do poema-chave, “A Sagrada Ceia”, quanto do próprio livro), provoca a concretização, a sacralização da proposta do livro: a urgência e coragem de se “olhar” para se “descobrir” e para “sentir” o seu próximo; a urgência e coragem de se buscarem as fontes de desajustes; a tentativa de resgate da angústia deles decorrente; a possibilidade de se tentar uma sondagem reparadora, que “revise a fome de santos e peregrinos”.
E enfrentando o percurso da reação, “o poeta refaz-se do último pesadelo” de sua “fome existencial”. Deixa entrever como atitude redentora “um leque de possibilidades”, apontando para a direção de seu olhar recriador, voltado para o Outro, para o Mundo e para Deus.
E, no último poema, “Duplo”, o poeta mostra, ao ser humano, a dicotomia responsável por tanta angústia, chamando a atenção para o homem e seu desdobramento visceral:
Caminhos me levam para fora de mim viajo. Não há como entender. (Refeição, p.117)
Busca o seu vôo, mas os pés estão presos em sua realidade. Parece vencido:
Há uma escuridão perpetuada. Manhã pesada. Mas quer readquirir forças para reagir:
Contemplo o meu corpo petrificado no espelho da sala. Reflito um abraço e vou dormir. (Refeição, p.118)
Assim, Francisco Perna Filho sintoniza, neste livro, nas imagens que sacralizam os dois campos de batalha, sua visão de poeta, no “ser passante” que somos; ousa argüi-lo, de maneira criativa, mas, talvez numa mostra de seu lado docente, busca apontar-lhe, ou melhor, sugerir-lhe, as vias de salvação. Seu imaginário está prenhe do universal e, poeta contemporâneo, consegue mostrar, com tenacidade, sua preocupação em torno da “difícil luta com as palavras”. Feliz iniciativa, Francisco Perna. Prossiga na sua árdua missão. Parabéns.
MOEMA DE CASTRO E SILVA OLIVAL, doutora em letras pela USP e professora emérita da Universidade Federal de Goiás, é escritora e crítica literária, autora, entre outros livros, de O Espaço da Crítica (Editora da UFG, 1998).
Este ensaio crítico foi publicado em dezembro de 2002, no Jornal Opção, em Goiânia.
Memória - entrevista com o Artista Plástico M. Cavalcanti
MARANHÃO CAVALCANTI |
“Precisamos de um novo Renascimento”
Esta entrevista foi originalmente publicada no Jornal Opção, de Goiânia, no dia 07 de março de 2004 |
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