O escritor Valdivino Braz fala sobre seu último livro, o romance “O Gado de Deus”, que ganhou recentemente o Prêmio Nacional Colemar Natal e Silva
Romancista, contista, poeta e jornalista Valdivino Braz tem 13 livros publicados, seis dos quais premiados, com destaque para o Prêmio Nacional de Literatura Cidade de Belo Horizonte, um dos mais importantes do Brasil, em 1992, com o livro de poemas “A Trompa de Falópio — Rapsódia de Homero Canhoto”. Em entrevista ao Jornal Opção, Valdivino Braz fala sobre seu último livro, o romance “O Gado de Deus”, que, no mês de abril, foi contemplado com o Prêmio Colemar Natal e Silva, em concurso nacional promovido pela Academia Goiana de Letras. Segundo o autor, “O Gado de Deus”, entre outras vias ou vieses de leitura, pode ser lido como uma espécie de testemunho — “Eu venho do brejo, e dele dou testemunho”, lê-se na obra, alusivamente às experiência do autor no sertão goiano, em memórias que se intercalam ou se fundem com realidades urbanas e alegoria dos fatos, para compor a linha narrativa, no plano da ficção. Uma técnica de estrutura numa linha de invenção: ficfricção (ficção de fricção) e/ou vice-versa (fricficção), num sentido de contraponto e atrito (dizer o oposto, o não-dito), segundo a concepção e proposta do escritor. Escorado em afirmativas de críticos literários como Jaime Ginz-burg, João Camillo Penna, Gustavo V. Garcia, Márcio Seligmann-Silva e James Hatley, o autor afirma que “O Gado de Deus”, obra híbrida, em que se mesclam gêneros literários, além dos componentes sociopolíticos, parodísticos, satíricos e alegóricos, não deixa de ser um pouco romance de testemunho, a par com ser também um pouco autobiográfico, num processo “em que se cruzam a biografia com a ficção, e a história com a literatura”.
De onde surgiram as ideias para “O Gado de Deus”?
O golpe militar de 64 foi o Produto Interno Bruto (PIB) para as narrações contidas no romance, feito um fio elétrico desencapado e sangrento, mesclando-se realidade e ficção. É uma história de pátria amada e armada. A título de combater ideologia de esquerda e zelar pela segurança nacional, a par com os interesses capitalistas e os planos militares embutidos num processo arbitrário, toma-se o poder e toma-se gosto pelo sangue derramado, oprimindo e humilhando o povo indefeso. Uma cavalar visão de caserna e disciplina para tropas, não para povo, fere profundamente o sentimento pátrio. O país de hoje ainda traz reflexos do golpe. Já o romance não poupa a ninguém, seja à direita, à esquerda e na retaguarda, enquanto morrem as vanguardas. Com menção honrosa em concurso nacional do Paraná, em 1992, tendo então concorrido como “As Dores da Terra Antiga”, e agora com novo título e maior dimensão, o romance mantinha-se inédito há duas décadas, e veio a público menos para repisar o pisoteio do golpe — terra batida de negra memória, já nos anais da história —, e mais para retirar da gaveta uma amarelada obra de ficção. Paródia, sátira, alegoria, o romance recebeu, em abril deste ano, e numa ainda tímida versão nacional, com reduzido número de inscrições, o Prêmio Colemar Natal e Silva, da Academia Goiana de Letras. Jaime Ginzburg fala-nos do passado que atormenta, da necessidade de narrar para não esquecer o horror traumático e de enfrentar-se o teor doloroso do que ocorreu. “O Gado de Deus”, romance de negros matizes e coágulos, quer-se também um Pequeno Tratado da Crueldade Humana, para incomodar, quem sabe, sonolentas consciências, e, quem dera, provocar reflexão. Com relevância à imagética da linguagem e uma técnica romanesca algo anárquica, liberta e libertina, os personagens-narradores são múltiplos e o mesmo, e são sempre idosos, machucados, chorosos, céticos e ressentidos, daí o subtítulo “Livro do Ressentimento”, alusivo à lama sanguinolenta do golpe, impregnada na alma de um povo.
Como foi a concepção do romance?
Imaginei uma ação militar numa cidade do interior, ao mesmo tempo sede municipal, Estado e País, que chamo de Pátria, misturando-se os tempos narrativos e os fatos, onde alguns personagens são baseados em pessoas reais, entre eles uma dona de bordel de Uberlândia (MG), onde vivi por quase quinze anos, e de onde trago cenas bordelescas, memorizadas desde a minha adolescência. De lá, também, o repulsivo personagem Mané Muié, como o batizei, que defecava em público e se limpava com a mão. Ainda de Uberlândia peguei o nome de Zé Mané (José Manoel), que por lá um dia se suicidou, durante a noite, cravando um punhal no peito. De Goiás, inspirei-me numas histórias hilárias que ouvi sobre um juiz de Direito (não me falhe a memória) e sobre o cabaré de Maria Branca, na Campininha das Flores e de tempos ludovicos. Floreei um pouco mais os fatos, e usei nome fictício para o juiz. Curioso é que de Maria Branca inverti para Branca Maria da Penha, quando a criação da Lei Maria da Penha, de proteção às mulheres, ainda nem era cogitada. Ficcionei o prenome do falecido pai de um ex-governador goiano, vitimado (o pai) por isquemia (insuficiência de sangue no coração) ou infarto agudo do miocárdio. Já o nome de uma certa pessoa que ficava aí denegrindo escritores goianos, e sempre dourando a pílula de sua “tribo”, medíocres bandinhas de rock (eu disse bandinhas, cuidado aí com a vogal), serviu-me para nomear um torturador. Irônico em relação à heresia que percorre “O Gado de Deus”, protagonizo, eu mesmo, o personagem Inocêncio de Deus Divino. Um outro personagem não deixa de ser homenagem (embora com tintas trágicas, de mera ficção, além de um cochilo gráfico) a um promotor de justiça, do meu apreço e de nome interessante, que juntei com Arquimedes, o grande matemático da antiguidade, e os poetas gregos Konstantinos Kaváfis e Giórgos Seféris. Espero que o promotor não se ofenda, nem comigo nem com o personagem, valendo lembrar que atuei, por cerca de oito anos, na equipe de assessoria de imprensa do Ministério Público goiano. Passei por quatro gestões ali, e delas guardo boas e imorredouras lembranças, entre elas de uma titular que sempre me deixou a impressão de que me tratava com menosprezo, parece que subestimando minha parca inteligência e, assim, causando-me constrangimento em meu trabalho. Como eu estava numa casa de justiça humana, depunha tudo nas mãos da suposta justiça divina, mas assim como quem arrisca a sorte na loteria, sabendo que se trata de um jogo de azar.
Com todos estes elementos, como se desenvolve o romance?
“O Gado de Deus” se move e vai se explicando por um viés metanarrativo, sob um caráter em geral carnavalizante, com pitadas de escárnio e sarcasmo, dentro do estilo que venho disseminando há anos: a forma brincalhona, a modo de se falar a sério. A obra quer-se também como cusparada no mau-caratismo social, no descaramento da corrupção política, nos descaminhos das instituições, dos poderes constituídos e das autoridades estabelecidas. Enfim, o Brasil de ontem e de hoje, um pouco aí com a farsa ideológica de uma gente prostituída, que se esqueceu do povo e se esperneia apenas pela sua própria sobrevivência e por seus interesses político-partidários, buscando o poder. Até gente que ainda se diz “de carteirinha”, mas com data vencida, exigindo revalidação. No romance, há referências sobre militantes usando o povo como trampolim político, tanto é que hoje os vejo eleitos vereadores ou deputados (e não é que ainda votei neles?), podendo também que sejam apenas proprietários de bancas de jornais e revistas. Eu os reconheço e eles não sabem disso. Baseei-me neles, durante as passeatas que eu cobria para o jornal “Folha de Goyaz”, vendo de perto os espertos que insuflavam o povo e, assim que surgia a tropa de choque dos PMs, caíam fora e deixavam o pobre povo apanhando e sangrando sozinho. Particular-mente, isso muito me abalou e me deu o que refletir, com um travo de desencanto; mas, como já tornei público, sempre estive do lado de cá (lugar do povo), na margem esquerda do rio, e longe dos holofotes. E bem antes da derrocada ideológica que vimos acontecer, vinha eu vaticinando o advento, por conta das contradições entre a edulcorada teoria e uma “práxis” repetindo as truculências autoritárias, as mesmas que eles mesmos, atuando de ponta-esquerda no jogo de forças opostas, viviam criticando. Isso me rendeu um conto, naquela época, e resultou num filmeto que, alunos de cinema na PUC-GO, e ainda leigos, produzimos no ano passado, sob o título “Mise-en-scène dos Mendigos — A Força da Inércia”.
Numa passagem do seu livro, você o classifica como antirromance.
E noutra passagem o classifico como romancepoema. Entre outras possíveis classificações, é também uma ficção de cunho político. Um riocorrente a contracorrente, formalmente arbitrário em termos de gêneros definidamente fixos e de bitolas teóricas. E agora escoro-me no livro “Literatura e Guerra”, organizado por Elcio Cornelsen e Tom Burns, que se abre com uma análise de três contos de Guimarães Rosa, feita por Jaime Ginzburg, no ensaio “Guimarães Rosa e o terror total”. Este acentua que o texto testemunhal, muito frequentemente, renuncia ao senso de unidade totalizante, e opta pela descontinuidade e pela fragmentação da forma. Creio que “O Gado de Deus” caminha um pouco neste sentido, alinear, descontínuo, fragmentário, porém alinhavando-se a fios de colcha de retalhos, e assim compondo sua unidade. A principal função da escrita de testemunho, segundo Gustavo V. Garcia, está no debate dos direitos civis. E “o testemunho busca dar voz àqueles que não puderam se manifestar, silenciados pelo discurso oficial e pela repressão” (Selig-mann-Silva). De acordo com João Camillo Penna, “na América Latina, o testemunho é caracterizado por uma concepção de política multicentralista, em que se desfazem maniqueísmos e estereótipos políticos.” E Seligmann-Silva afirma também que o conceito de realidade é problematizado no testemunho, enquanto Jaime Ginzburg diz que “o fato de que os indivíduos não conseguem controlar o processo histórico faz parte da configuração negativa da imagem de realidade construída nos textos”. É de observar-se, neste aspecto, um personagem de “O Gado de Deus” dizendo que a realidade é imoral. “O testemunho — salienta James Hatley — está constantemente associado a graus inaceitáveis de dor física, repressão e violência. Ele se volta a situações em que se cria uma ambiguidade: ao mesmo tempo em que é necessário lembrar o que ocorreu, para evitar a repetição do horror, evocar a dor contribui para reencotrar o sofrimento.” Note-se, em meu romance, por conta dos personagens, uma certa ambiguidade em seus discursos, ideologicamente a favor ou contra, e hereticamente dúbios, que não se explicitam de todo entre crer e não crer, entre o crente e o cético, aquele que crê e descrê, desconstruindo-se, assim, no âmbito da própria crença. Como observa Jaime Ginzburg, citando Hannah Arendt: “O regime totalitário destrói os espaços entre os seres humanos, as crenças em leis que organizem esses espaços, e o princípio mesmo da liberdade humana. Estabelece o terror como condição de impedir mudanças fora do interesse do Estado”. Já os narradores de “O Gado de Deus” articulam-se em tom melancólico, e decorre que “a melancolia que impregna o texto está associada à perspectiva das perdas não superadas, dos esforços de sobrevivência que não tiveram êxito” (Ginzburg). É por essas e outras que “O Gado de Deus” espreme sangue e exprime sofrimento.
Na abertura do romance, você adverte o leitor, no sentido de que ele esteja preparado para ler o livro.
O romance lida com o gado, o rebanho de Deus, como se diz da humanidade, logo é um bicho bruto, e não é livro para espíritos fracos, muito menos para fanáticos religiosos ou ideológicos, embora nada os impeça de ler a obra, mas lê-la com inteligência, para entender a dimensão humana dos personagens, com as implicações de suas falas e ações. Sobretudo, entender as dimensões e a essência da literatura. Em meu livro, além do aspecto político, há conflito dos personagens com a ideia de um Deus onisciente, onipotente e onibondoso, mas ausente em relação a tanto sofrimento mundo afora, haja vista que não se tem notícia dele em Auschwitz, Hiroshima, Vietnã, Brasil de 1964, World Trade Center, tsunâmis e tantas outras catástrofes ou tragédias. Sem falar nos tarados estuprando inocentes indefesos, até bebês ainda no berço; e de mães desalmadas, parindo escondido e jogando o recém-nascido no lixo. Como diz um dos narradores em meu romance, a natureza é crueldade, devoração, e este é o mundo criado, este o brinquedo de Deus. Jogando pesado, afirma que o homem é o cão de Deus e, se é um demônio, é a cria carnívora de Deus. Criador e criatura, a natureza do mal. Arrepiante, pois não? Isto corre por conta do personagem e da ficção, meus bodes expiatórios, mas, risivelmente, “eu não vi e não sei de nada”, e aprendi a dizer isso com o ex-presidente Lula.
Há planos para uma reedição? Você pensa em atingir o mercado do eixo Rio-São Paulo? À parte as imperfeições e os futuros reparos que a obra impõe, e aqui vendendo meu peixe, ouso dizer que “O Gado de Deus” pode não ser um dos melhores do gênero em Goiás, mas é a paródia que faltava na literatura goiana, que é tão brasileira quanto a de outros Estados. O romance tem defeitos e excessos, equívocos por descuido de memória e falhas na revisão textual, até por razões alheias aos meus cuidados. Há, inclusive, a parte em que me refiro ao “Caderno Avante”, afirmando que a capa do mesmo era ilustrada por soldados brasileiros na Segunda Guerra Mundial, quando na verdade se trata de escoteiros, uma falha de memória que só percebi a partir de um artigo do escritor e jornalista Luiz de Aquino, publicado em seu blog. Aquino não menciona a minha falha, mas penso que o artigo veio a propósito da mesma, e grato fiquei pelo esclarecimento; tanto é que, também a propósito, redigi e foi publicado, no mesmo blog, o artigo intitulado “Uma mão e um mamão”. O irônico é que, antes de publicado “O Gado de Deus”, eu havia apontado, em artigo publicado na “Revista Bula”, um cochilo do destacado escritor Ronaldo Costa Fernandes, em seu romance “O Morto Solidário”, no qual ele se refere ao homem com o bacalhau nas costas como ilustração no rótulo do fortificante Biotônico Fontoura, quando tal rótulo é do purgante Emulsão Scott. Humildemente me prosto. “Errare humanum este”. Quanto a chegar ao eixo Rio-São Paulo, não é fácil, tanto quanto ser ilusório. Bom seria se houvesse interesse e, pelo menos, com uma nova edição do livro, uma ponte de editora goiana até o chamado grande eixo editorial e midiático do país, bem como no vestibular das universidades goianas. Boa experiência seria discutir-se o romance nos auditórios universitários, tendo em vista a multiplicidade de aspectos e detalhes que presumo interessantes a uma discussão, especialmente com mestres e alunos do curso de Letras, entre outros interessados. Quem sabe o romance chegasse também às unidades do Ensino Médio, a menos que julguem-no inadequado para os “avançados” adolescentes de hoje, podendo que alguns professores, estacionados no tempo, ainda prefiram aplicar-lhes a “Inocência”, espécie de Romeu e Julieta sertanejo, de Visconde de Taunay, escrito no século 18.
No livro, você (ou seu personagem) se mostra bastante descontente com a geração pós-ditadura. Por quê?
O personagem está centrado entre 1980 e 1990, portanto não se refere a exatamente hoje, embora suas palavras possam ressoar nos dias atuais. Refere-se a uma juventude que sobrou despersonalizada pela opressão e repressão militar. Jovens que o personagem não reconhece como os mesmos patrícios de antes, daí um doloroso sentimento de perda, da juventude e da Pátria de seu tempo. “O Gado de Deus” alude a uma geração castrada pelo golpe, o que vem metaforicamente simbolizado com a cena de castração de um jovem professor. Outro professor é baleado e morto, então há também alusão crítica ao sistema educacional. Por outro lado, e lamentavelmente, boa parte da juventude atual é portadora de ignorância histórica, desinteresse pela cultura, estrábica noção de valores, estereotipado estilo de vida. Jovens manipulados pela mídia do consumismo, da exaltação narcisista e de uma precoce exploração da libido. Violência gratuita, testosterona com adrenalina, álcool e drogas por atacado e a granel. Não creio que uma parte dessa juventude esteja preocupada com o seu próprio futuro, ou, no mínimo, com a droga de vida que está levando, enredada na malha de se morrer jovem e hoje mesmo. Salve-se a juventude, “o lindo pendão da esperança”, aqui utilizando um verso do Hino da Bandeira Nacional, composição de Olavo Bilac e Augusto Braga. Aliás, Olavo Bilac, no meu romance, é Ovalo Calib, numa grafia inversa, de tempos adversos. O futuro, social, cultural e politicamente falando, se descortina sombrio, já o presente configurado num pesadelo real. Tudo por conta do individual e do coletivo, com a parcela de culpa de cada um: do Estado, dos poderes constituídos, da família, da sociedade como um todo. Contudo, é visto que boa parte da juventude abraça com afinco os seus estudos, encara a realidade da vida e se prepara para o futuro, por incerto que ele possa parecer. Assim, ainda resta uma esperança, como se costuma dizer.
“Pátria” e seu “rebanho” têm futuro?
Não morro de amores pela “pátria” madrasta do meu romance. E já em nossos dias, a política brasileira tem uma banda podre, até comendo pelas bordas os poderes constituídos. Os homens do nosso país já não inspiram confiança. Descaramento e cinismo estão rindo na nossa cara, amiúde à sombra das tais “brechas da lei” e da impunidade. O que há com os doutos meritíssimos? E que Constituição esfarrapada é esta, com um descaramento que muito favorece à criminalidade e à impunidade? E essas polícias aí? A própria justiça, às vezes, é caso de polícia no Brasil. Tenho observado que os maus políticos e certos governantes estão contribuindo para a disseminação da canalhice, e que a sociedade, espelhando-se neles, está se corrompendo, perdendo o senso ético. E mais não digo para não contaminar a outros com o meu desencanto. No ano passado, em face da realidade do país, publiquei, via internet (“Revista Bula”), um texto afirmando que somos todos sórdidos. Em seguida, alguém mais, filósofo e médico, veio ao mesmo veículo afirmando que somos todos crápulas. Somos ou não somos “um país que vai pra frente”, como apregoavam as patentes militares de 1964? Deu no que deu. Sórdidos e crápulas. Cínicos e impunes.
Há heresia em seus personagens. Você acredita na existência de Deus?
Creio, descreio, crio para crer. Está publicado em meu livro “As Lâminas de Zarb” (Braz ao inverso). Não posso negar o grande enigma cósmico, nem o mistério da vida, que não se explica pelo simples fato de existir. Que sabemos nós, que de nada sabemos? Já o nosso mundo é uma carnificina só, até com o terrorismo em nome de Deus, fanatismo religioso e, sob as barbas de omissas autoridades, o crime de extorsão por hipnose coletiva. Já não bastassem, de sobra, as trevas disseminadas pela Igreja medieval, com as góticas gárgulas do horror na Santa (Diabólica) Inquisição. Aquela Igreja sombria e pecaminosa, que se arrogava absoluta abaixo de Deus, impediu, atrasou, e muito, o desenvolvimento da humanidade, que talvez já estaria um passo mais à frente. Não há pedido de perdão, de papa nenhum, que redima a Igreja de tão negro período na história da humanidade. O que se espera, no presente, é que se faça justiça e sejam punidos os pedófilos sob o maculado manto do clero. E o homem, entre a razão e o sentimento (mesmo em seu ofício de fé), deve se reciclar, rever tudo, e se reconstruir. De resto, e de imediato, somos problemas gerados por nós mesmos, e cabe a nós resolvê-los. Voltando ao início da pergunta, e no que me diz respeito, se um Deus há, haverá ele de cuidar de mim, e ponto final. Não preciso que me venham dizer mais nada, pois ninguém sabe coisíssima nenhuma do que presume que seja Deus. Talvez os verdadeiros desígnios de Deus sejam mesmo que morramos para então sabermos. Assim, quem viver, morrerá. “Não temas, segue adiante, segura na mão de Deus e vai”. Baibai! Pano de fundo musical para a fúnebre ocasião.
Adérito Schneider é jornalista.