Vinícius de Moraes - Crônica






Vinícius de Moraes









A transfiguração pela poesia




Creio firmemente que o confinamento em si mesmo, imposto a toda uma legião de criaturas pela guerra, é dinamite se acumulando no subsolo das almas para as explosões da paz. No seio mesmo da tragédia sinto o fermento da meditação crescer. Não tenho dúvida de que poderosos artistas surgirão das ruínas ainda não reconstruídas do mundo para cantar e contar a beleza e reconstruí-lo livre. Pois na luta onde todos foram soldados - a minoria nos campos de batalha, a maioria nas solidões do próprio eu, lutando a favor da liberdade e contra ela, a favor da vida e contra ela - os sobreviventes, de corpo e espírito, e os que aguardaram em lágrimas a sua chegada imprevisível, hão de se estreitar num abraço tão apertado que nem a morte os poderá separar. E o pranto que chorarem juntos há de ser água para lavar dos corações o ódio e das inteligências o mal-entendido.

Porque haverá nos olhos, na boca, nas mãos, nos pés de todos uma ânsia tão intensa de repouso e de poesia, que a paixão os conduzirá para os mesmos caminhos, os únicos que fazem a vida digna: os da ternura e do despojamento. Tenho que só a poesia poderá salvar o mundo da paz política que se anuncia - a poesia que é carne, a carne dos pobres humilhados, das mulheres que sofrem, das crianças com frio, a carne das auroras e dos poentes sobre o chão ainda aberto em crateras.Só a poesia pode salvar o mundo de amanhã. E como que é possível senti-la fervilhando em larvas numa terra prenhe de cadáveres. Em quantos jovens corações, neste momento mesmo, já não terá vibrado o pasmo da sua obscura presença? Em quantos rostos não se terá ela plantado, amarga, incerta esperança de sobrevivência? Em quantas duras almas já não terá filtrado a sua claridade indecisa? Que langor, que anseio de voltar, que desejo de fruir, de fecundar, de pertencer, já não terá ela arrancado de tantos corpos parados no antemomento do ataque, na hora da derrota, no instante preciso da morte? E a quantos seres martirizados de espera, de resignação, de revolta já não terão chegado as ondas do seu misterioso apelo?

Sofre ainda o mundo de tirania e de opressão, da riqueza de alguns para a miséria de muitos, da arrogância de certos para a humilhação de quase todos. Sofre o mundo da transformação dos pés em borracha, das pernas em couro, do corpo em pano e da cabeça em aço. Sofre o mundo da transformação das mãos em instrumentos de castigo e em símbolos De força. Sofre o mundo da transformação da pá em fuzil, do arado em tanque de guerra, da imagem do semeador que semeia na do autômato com seu lança-chamas, de cuja sementeira brotam solidões.

A esse mundo, só a poesia poderá salvar, e a humildade diante da sua voz. Parece tão vago, tão gratuito, e no entanto eu o sinto de maneira tão fatal! Não se trata de desencantá-la, porque creio na sua aparição espontânea, inevitável. Surgirá de vozes jovens fazendo ciranda em torno de um mundo caduco; de vozes de homens simples, operários, artistas, lavradores, marítimos, brancos e negros, cantando o seu labor de edificar, criar, plantar, navegar um novo mundo; de vozes de mães, esposas, amantes e filhas, procriando, lidando, fazendo amor, drama, perdão. E contra essas vozes não prevalecerão as vozes ásperas de mando dos senhores nem as vozes soberbas das elites. Porque a poesia ácida lhes terá corroído as roupas. E o povo então poderá cantar seus próprios cantos, porque os poetas serão em maior número e a poesia há de velar.



in Para viver um grande amor (crônicas e poemas)
in Poesia completa e prosa: "Para viver um grande amor"
Imagem retirada da Internet: Poesia.

Vinícius de Moraes - Poema






Vinícius de Moraes







A anunciação


Virgem! filha minha
De onde vens assim
Tão suja de terra
Cheirando a jasmim
A saia com mancha
De flor carmesim
E os brincos da orelha
Fazendo tlintlin?
Minha mãe querida
Venho do jardim
Onde a olhar o céu
Fui, adormeci.
Quando despertei
Cheirava a jasmim
Que um anjo esfolhava
Por cima de mim...



Montevidéu, 01.11.1958


in Para viver um grande amor (crônicas e poemas)
in Poesia completa e prosa: "A lua de Montevidéu"
Imagem retirada da Internet: Jasmin.

Gerardo Mello Mourão - Poema







Gerardo Mello Mourão












NASCIMENTO DE AFRODITE



Galpopam os cavalos
coroados de rosas
pela aurora da China

as éguas de esmeralda
as poldras de ouro
amadurecem, Laura,
o jade das laranjas redondas.
Caminha agora
recorta o azul
sobre as águas perplexas.

Os cavalos
esmorecem ressupinos
e em seus cascos nas águas
os ginetes
pedem às ondas
e as ondas suplicadas
guardam o milagre:

por esse rastro
peregrinos
do azul do verde das espumas
- espera -
em torno às flautas
aura
Laura
até o serpentário
de teus cabelos
de onde
virias com -
digo virias
na virilha
flutuas
tuas
auroras tuas caravelas
o sargaço das cristas
pois deste mar
- ó madrepérola! -
tu flor
tu fruto
coisa de luz
coisa de sombra
coisa
de galoparem cavalos
coroados de rosas
pela aurora da China
quando
sacodes as laranjas
e as poldras
amaduram o ouro
pendem as estrelas
e a terra
desabrocha
à primavera:

vais olhando em redor
e
para sempre
sou eu
pois és nascida.

Pequim, 1980


In.Cânon & Fuga.Rio de Janeiro: Record, 1999,p.89.
Imagem: The Birth of Venus, de William-Adolphe Bouguereau

Carlos Drummond de Andrade - Poema








Carlos Drummond de Andrade








PRIVILÉGIO DO MAR



Neste terraço mediocremente confortável,
bebemos cerveja e olhamos o mar.
Sabemos que nada nos acontecerá.

O edifício é sólido e o mundo também.

Sabemos que cada edifício abriga mil corpos
labutando em mil compartimentos iguais.
Às vezes, alguns se inserem fatigados no elevador
e vêm cá em cima respirar a brisa do oceano,
o que é privilégio dos edifícios.

O mundo é mesmo de cimento armado.

Certamente, se houvesse um cruzador louco,
fundeado na baía em frente da cidade,
a vida seria incerta...improvável...
Mas nas águas tranquilas só há marinheiros fiéis.
Como a esquadra é cordial!

Podemos beber honradamente nossa cerveja.



In.Sentimento do mundo. 2ª ed..Rio de Janeiro: Record,2002,p41
Imagem retirada da Internet: Drummond.

Heleno Godoy - Poema





Feliz Natal !


Com este belo poema do professor, tradutor e poeta Heleno Godoy, quero desejar um Feliz Natal a todos os amigos leitores do Banzeiro Textual.





Noite de Natal



Quem se arriscaria, nesta noite,
a um novo palpite: encurtar asas
deste anjo rebelde, ampliar rotas
de pássaros migratórios? Mas de
que nos serviriam menos penas, rotas
outras, mais traiçoeiras, um sertão
e suas veredas revisitadas por um
olhar erroneamente cubista, pois
jamais fragmentada aquela linguagem,
tão grande em suas múltiplas veredas?
Que anjo não deixaria, nesta noite
e em todas as outras (pois temos de
aturá-lo), novas penas crescerem;
que pássaros (temos de admitir)
outras fáceis rotas não buscariam?
Reconheçamos também assim esta
noite: um encurtamento de toscas rotas,
um ampliar de duras penas, uma pluralidade
de visões integrativas, estas sim, cubistas,
no sertão e em todas as suas veredas.

Imagem retirada da Internet: Papai Noel.

Fiódor Mikhailovich Dostoiévski - Conto







Fiódor Dostoiévski
Фёдор Достое́вский
(1821-1881)










A árvore de Natal na casa de Cristo




Havia num porão uma criança, um garotinho de seis anos de idade, ou menos ainda. Esse garotinho despertou certa manhã no porão úmido e frio. Tiritava, envolto nos seus pobres andrajos. Seu hálito formava, ao se exalar, uma espécie de vapor branco, e ele, sentado num canto em cima de um baú, por desfastio, ocupava-se em soprar esse vapor da boca, pelo prazer de vê-lo se esvolar. Mas bem que gostaria de comer alguma coisa. Diversas vezes, durante a manhã, tinha se aproximado do catre, onde num colchão de palha, chato como um pastelão, com um saco sob a cabeça à guisa de almofada, jazia a mãe enferma. Como se encontrava ela nesse lugar? Provavelmente tinha vindo de outra cidade e subitamente caíra doente. A patroa que alugava o porão tinha sido presa na antevéspera pela polícia; os locatários tinham se dispersado para se aproveitarem também da festa, e o único tapeceiro que tinha ficado cozinhava a bebedeira há dois dias: esse nem mesmo tinha esperado pela festa. No outro canto do quarto gemia uma velha octogenária, reumática, que outrora tinha sido babá e que morria agora sozinha, soltando suspiros, queixas e imprecações contra o garoto, de maneira que ele tinha medo de se aproximar da velha. No corredor ele tinha encontrado alguma coisa para beber, mas nem a menor migalha para comer, e mais de dez vezes tinha ido para junto da mãe para despertá-la. Por fim, a obscuridade lhe causou uma espécie de angústia: há muito tempo tinha caído a noite e ninguém acendia o fogo. Tendo apalpado o rosto de sua mãe, admirou-se muito: ela não se mexia mais e estava tão fria como as paredes. "Faz muito frio aqui", refletia ele, com a mão pousada inconscientemente no ombro da morta; depois, ao cabo de um instante, soprou os dedos para esquentá-los, pegou o seu gorrinho abandonado no leito e, sem fazer ruído, saiu do cômodo, tateando. Por sua vontade, teria saído mais cedo, se não tivesse medo de encontrar, no alto da escada, um canzarrão que latira o dia todo, nas soleiras das casas vizinhas. Mas o cão não se encontrava alí, e o menino já ganhava a rua.

Senhor! que grande cidade! Nunca tinha visto nada parecido, De lá, de onde vinha, era tão negra a noite! Uma única lanterna para iluminar toda a rua. As casinhas de madeira são baixas e fechadas por trás dos postigos; desde o cair da noite, não se encontra mais ninguém fora, toda gente permanece bem enfunada em casa, e só os cães,às centenas e aos milhares,uivam, latem, durante a noite. Mas, em compensação, lá era tão quente; davam-lhe de comer... ao passo que ali... Meu Deus! se ele ao menos tivesse alguma coisa para comer! E que desordem, que grande algazarra ali, que claridade, quanta gente, cavalos, carruagens... e o frio, ah! este frio! O nevoeiro gela em filamentos nas ventas dos cavalos que galopam; através da neve friável o ferro dos cascos tine contra a calçada;toda gente se apressa e se acotovela, e, meu Deus! como gostaria de comer qualquer coisa, e como de repente seus dedinhos lhe doem! Um agente de policia passa ao lado da criança e se volta, para fingir que não vê.

Eis uma rua ainda: como é larga! Esmaga-lo-ão ali, seguramente; como todo mundo grita, vai, vem e corre, e como está claro, como é claro! Que é aquilo ali? Ah! uma grande vidraça, e atrás dessa vidraça um quarto, com uma árvore que sobe até o teto; é um pinheiro, uma árvore de Natal onde há muitas luzes, muitos objetos pequenos, frutas douradas, e em torno bonecas e cavalinhos. No quarto há crianças que correm; estão bem vestidas e muito limpas, riem e brincam, comem e bebem alguma coisa. Eis ali uma menina que se pôs a dançar com um rapazinho. Que bonita menina! Ouve-se música através da vidraça. A criança olha, surpresa; logo sorri, enquanto os dedos dos seus pobres pezinhos doem e os das mãos se tornaram tão roxos, que não podem se dobrar nem mesmo se mover. De repente o menino se lembrou de que seus dedos doem muito; põe-se a chorar, corre para mais longe, e eis que, através de uma vidraça, avista ainda um quarto, e neste outra árvore, mas sobre as mesas há bolos de todas as qualidades, bolos de amêndoa, vermelhos, amarelos, e eis sentadas quatro formosas damas que distribuem bolos a todos os que se apresentem. A cada instante, a porta se abre para um senhor que entra. Na ponta dos pés, o menino se aproximou, abriu a porta e bruscamente entrou. Hu! com que gritos e gestos o repeliram! Uma senhora se aproximou logo, meteu-lhe furtivamente uma moeda na mão, abrindo-lhe ela mesma a porta da rua. Como ele teve medo! Mas a moeda rolou pelos degraus com um tilintar sonoro: ele não tinha podido fechar os dedinhos para segurá-la. O menino apertou o passo para ir mais longe - nem ele mesmo sabe aonde. Tem vontade de chorar; mas dessa vez tem medo e corre. Corre soprando os dedos. Uma angústia o domina, por se sentir tão só e abandonado, quando, de repente: Senhor! Que poderá ser ainda? Uma multidão que se detém, que olha com curiosidade. Em uma janela, através da vidraça, há três grandes bonecos vestidos com roupas vermelhas e verdes e que parecem vivos! Um velho sentado parece tocar violino, dois outros estão em pé junto de e tocam violinos menores, e todos maneiam em cadência as delicadas cabeças, olham uns para os outros, enquanto seus lábios se mexem; falam, devem falar - de verdade - e, se não se ouve nada, é por causa da vidraça. O menino julgou, a princípio, que eram pessoas vivas, e, quando finalmente compreendeu que eram bonecos, pôs-se de súbito a rir. Nunca tinha visto bonecos assim, nem mesmo suspeitava que existissem! Certamente, desejaria chorar, mas era tão cômico, tão engraçado ver esses bonecos! De repente pareceu-lhe que alguém o puxava por trás. Um moleque grande, malvado, que estava ao lado dele, deu-lhe de repente um tapa na cabeça, derrubou o seu gorrinho e passou-lhe uma rasteira. O menino rolou pelo chão, algumas pessoas se puseram a gritar: aterrorizado, ele se levantou para fugir depressa e correu com quantas pernas tinha, sem saber para onde. Atravessou o portão de uma cocheira, penetrou num pátio e sentou-se atrás de um monte de lenha. "Aqui, pelo menos", refletiu ele, "não me acharão: está muito escuro."

Sentou-se e encolheu-se, sem poder retomar fôlego, de tanto medo, e bruscamente, pois foi muito rápido, sentiu um grande bem-estar, as mãos e os pés tinham deixado de doer, e sentia calor, muito calor, como ao pé de uma estufa. Subitamente se mexeu: um pouco mais e ia dormir! Como seria bom dormir nesse lugar! "mais um instante e irei ver outra vez os bonecos", pensou o menino, que sorriu à sua lembrança: "Podia jurar que eram vivos!"... E de repente pareceu-lhe que sua mãe lhe cantava uma canção. "Mamãe, vou dormir; ah! como é bom dormir aqui!"

- Venha comigo, vamos ver a árvore de Natal, meu menino - murmurou repentinamente uma voz cheia de doçura.

Ele ainda pensava que era a mãe, mas não, não era ela. Quem então acabava de chamá-lo? Não vê quem, mas alguém está inclinado sobre ele e o abraça no escuro, estende-lhe os braços e... logo... Que claridade! A maravilhosa árvore de Natal! E agora não é um pinheiro, nunca tinha visto árvores semelhantes! Onde se encontra então nesse momento? Tudo brilha, tudo resplandece, e em torno, por toda parte, bonecos - mas não, são meninos e meninas, só que muito luminosos! Todos o cercam, como nas brincadeiras de roda, abraçam-no em seu vôo, tomam-no, levam-no com eles, e ele mesmo voa e vê: distingue sua mãe e lhe sorrir com ar feliz.

- Mamãe! mamãe! Como é bom aqui, mamãe! - exclama a criança. De novo abraça seus companheiros, e gostaria de lhes contar bem depressa a história dos bonecos da vidraça... - Quem são vocês então, meninos? E vocês, meninas, quem são? - pergunta ele, sorrindo-lhes e mandando-lhes beijos.

- Isto... é a árvore de Natal de Cristo - respondem-lhe. - Todos os anos, neste dia, há, na casa de Cristo, uma árvore de Natal, para os meninos que não tiveram sua árvore na terra...

E soube assim que todos aqueles meninos e meninas tinham sido outrora crianças como ele, mas alguns tinham morrido, gelados nos cestos, onde tinham sido abandonados nos degraus das escadas dos palácios de Petersburgo; outros tinham morrido junto às amas, em algum dispensário finlandês; uns sobre o seio exaurido de suas mães, no tempo em que grassava, cruel, a fome de Samara; outros, ainda, sufocados pelo ar mefítico de um vagão de terceira classe. Mas todos estão ali nesse momento, todos são agora como anjos, todos juntos a Cristo, e Ele, no meio das crianças, estende as mãos para abençoá-las e às pobres mães... E as mães dessas crianças estão ali, todas, num lugar separado, e choram; cada uma reconhece seu filhinho ou filhinha que acorrem voando para elas, abraçam-nas, e com suas mãozinhas enxugam-lhes as lágrimas, recomendando-lhes que não chorem mais, que eles estão muito bem ali...

E nesse lugar, pela manhã, os porteiros descobriram o cadaverzinho de uma criança gelada junto de um monte de lenha. Procurou-se a mãe... Estava morta um pouco adiante; os dois se encontraram no céu, junto ao bom Deus.


Imagem retirada da Internet: Crianças exploradas.

Francisco Perna Filho - Poema



Francisco Perna Filho



NATAL


Eu nunca fiz um poema de Natal,

talvez por não sabê-lo,

embora compreenda sua simbologia.

Sei que o Cristo renasce em cada coração,

que as cidades se enchem de luzes coloridas e brilhantes,

que os homens tornam-se mais solidários e felizes.

Eu sei de tudo isso,

mas também sei dos homens empedernidos,

das mulheres maltratadas,

das crianças abusadas,

das trapaças,

e das sórdidas armações palacianas.

Eu sei de tanta coisa,

mas ainda sei tão pouco da vida,

talvez esteja aí a minha dificuldade para compor um poema natalino.

Seria fácil falar de presentes,

desejar votos de felicidades,

falar de abraços e sorrisos,

de manjedouras e presépios,

de um menino que nasce para salvação do mundo.

Talvez fosse simples assim,

mas a verdade se nos impõe cortante,

as cores, apesar indução midiática,

são de outras matizes, de menos brilho e bem doídas,

como no conto de Dostoievski “A Árvore de Natal na Casa do Cristo”,

ou no romance “O Caçador de Pipas”, de Khaled Hosseini,

ou, quem sabe, no absurdo de "A Metamorfose", de Franz Kafka.

Sei que num poema de Natal os leitores desejam cantatas,

louvores e muita alegria,

não havendo espaço para qualquer pensamento destoante

daquilo quem vem a ser bondade.

Tampouco para palavras que roubem a esperança de centenas de milhares de miseráveis

espalhados nas prisões,

nos campos de trabalho escravo,

nos hospitais e hospícios,

nos cárceres dos regimes totalitários.

Um poema de Natal

não comporta maldade,

estelionato,

usurpação.

Num poema de Natal

todos devem estar felizes,

solícitos e

amigáveis.

Por tudo isso,

é que eu sinto dificuldade em fazer um poema de Natal.

Para o ano que vem,

desejo que as coisas melhorem,

que a verdade consiga vencer os artifícios,

que os olhares possam refletir as almas,

que os homens consigam se dar as mãos,

que as crianças possam confiar nos pais,

e que os velhos tenham dignidade.

Para o ano que vem

eu não prometo um poema de Natal, ainda,

mas estou certo de que serei melhor,

que seremos melhores

em todos os aspectos.

Com tanta coisa para falar,

e o poema que não vem,

para este ano,

aproveito para dizer

que continuo acreditando no homem,

na sua bondade,

na sua criatividade,

no seu amor.

Aproveito para louvar a Deus,

na sua infinina sabedoria e nobreza,

que, apesar da maldade humana,

nunca abandona os seus filhos.

Aproveito para desejar um Feliz Natal!





domingo, 20 de dezembro de 2009



Imagem retirada da Internet:Natal.

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