Joaquim Cardozo - Poema







JOAQUIM CARDOZO








O Relógio


Quem é que sobe as escadas
Batendo o liso degrau?
Marcando o surdo compasso
Com uma perna de pau?

Quem é que tosse baixinho
Na penumbra da ante-sala?
Por que resmunga sozinho?
Por que não cospe e não fala?

Por que dois vermes sombrios
Passando na face morta?
E o mesmo sopro contínuo
Na frincha daquela porta?

Da velha parede triste
No musgo roçar macio:
São horas leves e tenras
Nascendo do solo frio.

Um punhal feriu o espaço...
E o alvo sangue a gotejar;
Deste sangue os meus cabelos
Pela vida hão de sangrar.

Todos os grilos calaram
Só o silêncio assobia;
Parece que o tempo passa
Com sua capa vazia.

O tempo enfim cristaliza
Em dimensão natural;
Mas há demônios que arpejam
Na aresta do seu cristal.
No tempo pulverizado
Há cinza também da morte:
Estão serrando no escuro
As tábuas da minha sorte.




Imagem retirada da Internet: Relógio.

Joaquim Cardozo - Poema



JOAQUIM CARDOZO




Chuva de caju



Como te chamas, pequena chuva inconstante e breve?
Como te chamas, dize, chuva simples e leve?
Teresa? Maria?
Entra, invade a casa, molha o chão,
Molha a mesa e os livros.
Sei de onde vens, sei por onde andaste.
Vens dos subúrbios distantes, dos sítios aromáticos
Onde as mangueiras florescem, onde há cajus e mangabas,
Onde os coqueiros se aprumam nos baldes dos viveiros
e em noites de lua cheia passam rondando os maruins:
Lama viva, espírito do ar noturno do mangue.
Invade a casa, molha o chão,
Muito me agrada a tua companhia,
Porque eu te quero muito bem, doce chuva,
Quer te chames Teresa ou Maria.


Imagem retirada da Internet: Caju.

Joaquim Cardozo - Poema






JOAQUIM CARDOZO





Joaquim Cardozo. Poeta, dramaturgo, engenheiro calculista. Nasceu no Recife em 26 de agosto de 1897 Grande estudioso e conhecedor da matemática, em cujo domínio penetrou com grande sensibilidade poética, inovou os métodos tradicionais do cálculo estrutural. Viabilizou, assim, a execução de obras complexas da arquitetura moderna, como as de Oscar Niemeyer. Calculou, para o arquiteto, as obras do Conjunto Pampulha, em Minas e, em Brasília, o Palácio da Alvorada, a Catedral, a cúpula do Congresso Nacional e o Itamarati, entre outras. Publicou os seguintes livros: Poemas (1947); Pequena antologia pernambucana (1948); Signo Estrelado (1960); Coronel de Macambira (1963); De uma noite de festa (1971); Poesias Completas (1971); Os anjos e os demônios de Deus (1973 );O capataz de Salema, Antonio Conselheiro, Marechal, boi de carro (1975); O interior da matéria (1976); Um livro aceso e nove canções sombrias (1981, póstumo). Faleceu em Olinda em 4 de novembro de 1978.



Menina


Os teus olhos de água,
Olhos frios e longos,
Esta noite penetraram.
Esta noite me envolveram.

Bem querida madrugada...

Olhos de sombra, olhos de tarde
Trazem miragens de meninas...
Bundas que parecem rosas.

Sob o caminho de muitas luas
O teu corpo floresceu.



Imagem retirada da Internete - Olho.

Luiz de Aquino - Poema



Luiz de Aquino




Luiz de Aquino Alves Neto nasceu em Goiás, em 1945. Estudou no Rio de Janeiro e em Goiânia, onde reside. Graduado em Geografia pela Universidade Católica de Goiás. Poeta, contista, cronista, é autor de muitos livros. Membro da União Brasileira de Escritores, da Academia Goiana de Letras e do Sindicato de Escritores do Rio de Janeiro.



VIDA




A força da corda

não força a sorte

nem corta o cachaço.


Na força da corda

o corte da forca

não solta o sanhaço.


Na lida e no eito

a liça e o feito

enfeitam o que faço.


No peito, o cio,

a vida no fio

que escorre frio

e morre no leito.




In. Antônio Miranda

Foto by Sinésio Dioliveira - Poeta - Todos os Direitos reservados.

Brasigóis Felício - Poema





BRASIGÓIS FELÍCIO




Brasigóis Felício nasceu em Aloândia (Go) em 1950. Tem 20 livros publicados, entre obras de poesia, conto, romance, crônica e crítica literária. Em sua bibliografia destacam-se Hotel do tempo, poesia, (Editora Civilização Brasileira, l982); Monólogos da Angústia, contos, (Prêmio Bolsa de Publicações Hugo de Carvalho Ramos), Diários de André, romance censurado e apreendido em 1976, por ordem do ex-ministro da Justiça, Armando Falcão; Viver é devagar, crônicas, l998, Literatura Contemporãnea em Goiás, crítica literária, O tempo dos homens sem rosto, poesia, Editora Estação Liberdade, e Memória da solidão, contos, Coleção Karajá, da Agência Goiana de Cultura. Trabalhou, como repórter e redator, nos jornais Cinco de Março, O Estado de Goiás, Revista Leia Agora, Revista Centro Oeste, O Top News. Em O Popular, onde atuou como repórter e redator do Caderno 2, durante 12 anos seguidos, iniciou sua carreira de cronista. Neste jornal assina, há oito anos, uma crônica semanal, na seção Crônicas & Outras Histórias. É detentor de dezenas de premiações, em nível regional e nacional, e integra antologias de contos e poemas publicadas no Brasil e no exterior. É membro da Academia Goiana de Letras, UBE-GO e Instituto Histórico e Geográfico do Estado de Goiás. Sobre sua obra em prosa e poesia já se pronunciaram renomados críticos e estudiosos de literatura. Na condição de jornalista e crítico de arte tem acompanhado, com reportagens e textos críticos, a movimentação das artes plásticas em Goiás, desde a década de 80. Escreveu textos críticos e apresentações para catálogos de exposições de artistas como Siron Franco, Antonio Poteiro, Maria Guilhermina, Iza Costa, D.J. Oliveira, Omar Souto, Sanatan, Enéas Silva, Né Luiz, Sival, e muitos outros.




ALMA ATLÂNTICA


Não sou eu quem me navega
Quem me navega é o mar.
(Paulinho da Viola)


O mar navega o Ser,
nas tempestades
da palavra incendiada.
O poeta navega a esmo
no mar de dardos
de seus atos insensatos.
Em que oceano aceso
navega o poeta errante
na singradura do instante?
Uma vida morta
não tece a manhã
no sol do Ser.
Se não sou o mar
em eterna luta
e contradição,
eu me estanco
no pântano da mornidão.
Eu só desejo
amar no mar
o insondável
a revelar-se
em ritual de ser
limite e vastidão.
Amar no mar
que em tudo existe
a parte grande
da minha alma Atlântica



Imagem retirada da Internet: Atlântico

Francisco Perna Filho - Poema




Francisco Perna Filho




O poema, a seguir, é uma homenagem que faço aos meus grandes amigos/irmãos: Valdivino Braz e Sinésio Dioliveira. Este ano, como estou morando em Palmas, não passamos os nossos aniversários juntos, como sempre o fazemos. Portanto, esta é uma forma de comemorarmos, de matarmos um pouco a saudade. Na fotografia, estou ladeado pelos dois: à esquerda, Valdivino; à direita, Sinésio. A foto faz parte do Álbum de fotos do Orkut do amigo Sinésio, e foi tirada num momento muito agradável, no Bar do Chaguinha, em Goiânia.


DE HOMENS E BARCOS


Os homens, naquele bar,

falaram de rios e mulheres

e riram dos seus feitos,

de suas histórias e amores,

sonharam lonjuras e amavios

e navegaram em olhos e dentes tão perfeitos

que chegaram a entender o vazio dos homens e das garrafas.

Sorveram o momento

e se alimentaram de boas palavras.

Não sabiam muito a respeito do amor,

por isso - sobreviveram.



Odir Rocha - Poema


Manoel Odir Rocha nasceu em Araguari - MG. É médico pela Faculdade de Ciências Médicas da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (Curitiba), onde também cursou (sem se graduar) Sociologia e Administração Pública. Veio para o Tocantins em 1971 (quando ainda era Goiás), mais especificamente para Colinas do Tocantins, onde montou um pequeno hospital. Em Colinas, exerceu a profissão de médico até a criação do novo Estado, quando foi eleito prefeito da cidade, só que agora Colinas do Tocantins. Concluído o mandato mudou-se para Palmas, sendo secretário municipal de Ação Social e Habitação do primeiro prefeito eleito. Foi ainda suplente de Deputado Federal, Secretário Estadual de Administração, Secretário Extraordinário para Assuntos Metropolitanos. Em 1996 foi eleito prefeito de Palmas. Poeta, contista e pesquisador em História, é membro da Academia Palmense de Letras, da Academia Tocantinense de Letras, da União Brasileira de Escritores e da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores (Sobrames). Odir Rocha é autor de várias obras literárias, valendo destacar o livro Terracanto, do qual o poema a seguir foi transcrito.



SOLITÁRIA CUNHÃ



Solitárias bacabas no cerrado,
buritis à beira do brejo,
gameleiras frondosas.
Ipês floridos adornando a aldeia,
aglomerados em moldura graciosa.

Fumaça grafite em espiral
brotando da cumeeira da oca
num aspecto sereno
e na ausência de vento.

Sol a pino, faiscante,
com um facho muito claro
alumiando o cume das árvores,
produzindo bizarras sombras.

Folhas novas de bananeira brava
esparramadas no chão
abrigando o corpo nu,
desejoso e gracioso
da solitária cunhã.


In. Terracanto. Odir Rocha. Palmas: Kelps, 2007, p.17

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