Luís Vaz de Camões - Soneto


Coitado! que em um tempo choro e rio


Coitado! que em um tempo choro e rio;
Espero e temo, quero e aborreço;
Juntamente me alegro e entristeço;
Du~a cousa confio e desconfio.

 
Voo sem asas; estou cego e guio;
E no que valho mais menos mereço.
Calo e dou vozes, falo e emudeço,
Nada me contradiz, e eu aporfio.

Queria, se ser pudesse, o impossivel;
Queria poder mudar-me e estar quedo;
Usar de liberdade e estar cativo;

Queria que visto fosse e invisivel;
Queira desenredar-me e mais me enredo:
Tais os extremos em que triste vivo!

Imagem retirada da Internet: máscaras

José Fernandes - Poema



PÁSCOA


Eu não vejo sua face, a olhos vistos;
mas ele me vê e me conduz por essa
estrada torta, a que faz reta e plana,
porque tenho de caminhar mesmo
sem saber o ponto da encruzilhada
com suas múltiplas direções.

Por isso, caminho de olhos abertos,
porque ele venceu a morte para me
dar a vida que me faltava antes do caos
e depois do pecado que trago entranhado
na minha essência de homem humano.

Mas, se ele me conduz, porque temer
a fala e o pecado que se enrosca solerte
entre as árvores do engano de Lilith
enrolada em minhas pernas sequer
desenhadas à sombra da lua nova?

Ele me conduz, porque a cruz destronou
a maçã e suas cores de pecado debuxadas
pelos pés da cobra que me queria lambido
pela língua bífida que morde o próprio rabo
e que me quer enrolado no centro do círculo.

Por isso caminho, sou homo viator, faço
a minha páscoa e a minha peregrinação, nasa’,
ao interior do verbo para nele me conformar
em homem e em poesia nesse êxodo sem fim
à Terra Prometida do reino da linguagem
que me transportar para a eternidade.


Imagem retirada da Internet: Easter

Gregório de Matos Guerra - Poema




A Cristo Senhor Nosso crucificado


Meu Deus, que estais pendente em um madeiro,
Em cuja Lei protesto de viver,
Em cuja Santa Lei hei de morrer,
Animoso, constante, firme e inteiro.

Neste lance, por ser o derradeiro,
Pois vejo a minha vida anoitecer,
É, meu Jesus, a hora de se ver
A brandura de um Pai, manso cordeiro.

Mui grande é vosso amor e meu delito;
Porém pode ter fim todo o pecar,
E não o vosso amor, que é infinito.

Essa razão me obriga a confiar
Que por mais que pequei neste conflito,
Espero em vosso amor de me salvar.

Leia também

Valdivino Braz - Poema

Soldado ucraniano Pavel Kuzin foi morto em Bakhmut  - Fonte BBC Ucrânia em Chamas - Século 21                               Urubus sobrevoam...