Antônio Cícero - Poema



GUARDAR

                                     
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela, isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o voo de um pássaro
Do que pássaros sem voos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica, por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.

Imagem retirada da Internet: Bird flying

S. Quasimodo - Poema

 
Agora que vem o dia

Finda é a noite e a lua
desata-se lenta no sereno,
se esconde nos canais.

     Tão vivo é setembro nesta terra
de planura, e verdes os prados
como nos vales do sul a primavera.
Deixei os amigo,
o coração escondi atrás de velhos muros,
para ficar só e recordar-te

      És mais distante do que a lua,
agora que o dia irrompe
e batem nas pedras cascos de cavalos!


Tradução de Dora Ferreira da Silva
Pintura de Nicoletta Tomás

     

S. Quasimodo - Poema

 
Antigo inverno


Nostalgia de tuas mãos claras
na penumbra da chama:
sabiam de robles e de rosas;
de morte. Antigo inverno.

     Milho buscavam os pássaros
e súbito eram de neve;
assim as palavras.
Um pouco de sol, auréola de anjo,
depois a névoa; e as árvores,
e nós, feitos de ar pela manhã


Tradução de Dora Ferreira da Silva
Imagem retirada da Internet: mãos

Geir Campos - Poemas




Noturno



Os dormentes velam
— com mãos de imatéria
agarrando os trilhos,
acalmando os trilhos
trêmulos de susto
quando passa o trem.

                                  
In. Canto Claro e Poemas Anteriores, Livraria José Olympio Editora, RJ, 1957.
Imagem retirada da internet: trilhos

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